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São muito preocupantes as previsões para as próximas décadas quanto ao aumento da prevalência das doenças crônicas não-transmissíveis, como as cardiovasculares, o diabetes, a obesidade e os diferentes tipos de câncer. Assim, do ponto de vista clínico e de saúde pública, é necessário que, além de melhores métodos de diagnóstico e tratamento, também sejam estabelecidas estratégias mais eficazes de prevenção de tais doenças. Isso requer que diferentes atitudes sejam tomadas, como adoção de hábitos alimentares saudáveis, prática contínua de atividade física e manutenção de peso adequado ao longo de toda a vida. Nesse contexto, uma pergunta que surge é: em que etapa da vida devemos adotar hábitos preventivos?

Estudos conduzidos nas últimas décadas, mais especificamente na área de pesquisa chamada “Origens desenvolvimentistas da saúde e doença” (do inglês Developmental origins of health and disease, ou DOHaD), indicam que esses cuidados devem ser tomados por nossas mães, quando ainda estamos em suas barrigas. Pesquisas epidemiológicas e experimentais mostram que maus hábitos alimentares acompanhados da obesidade durante etapas críticas – como gestação e lactação – podem alterar de forma sutil o desenvolvimento do feto e do recém-nascido, elevando o risco para doenças na idade adulta.

Por causa disso, nota-se um aumento da preocupação de futuras mães quanto ao seu próprio estado de saúde. Em paralelo, especialistas como nutricionistas, nutrólogos e ginecologistas/obstetras têm se mostrado particularmente atentos às condições nutricionais e metabólicas das mulheres. Os pediatras, por sua vez, acompanham as crianças considerando não só o curto prazo, mas também o futuro.

Falta uma peça na história

Na contramão, chama a atenção o fato de que o futuro pai frequentemente não é considerado nesse panorama. Muitas vezes, a percepção é a de que a participação do homem fica restrita ao fornecimento de metade do DNA através de seu espermatozoide no momento da concepção. Até mesmo as pesquisas acadêmicas conduzidas no contexto do conceito DOHaD só passaram a considerar o papel paterno na saúde dos filhos nos últimos dez anos.

Desde então, um número crescente de estudos, principalmente em animais de laboratório, tem evidenciado que a exposição de machos a dietas obesogênicas aumenta a suscetibilidade de sua prole a apresentar doenças metabólicas e também câncer de mama. Trabalhos moleculares ajudam a esclarecer o que está por trás desse fenômeno. Até o momento, sabe-se que a produção de espermatozoides – que começa na puberdade e dura toda a vida fértil do homem – envolve a regulação de processos denominados epigenéticos.

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O que acontece na prática

Em outras palavras, essas etapas da vida masculina são consideradas janelas de suscetibilidade a alterações epigenéticas promovidas pelo meio ambiente nas células sexuais – a alimentação seria um dos fatores capazes de levar a mudanças nesse nível. Embora elas não modifiquem a sequência do DNA, podem, conjuntamente, afetar a forma como os genes se comportam no longo prazo.

Por isso, estudos têm revelado que marcas epigenéticas alteradas no espermatozoide podem ser herdadas pelo bebê e permanecer com ele até a idade adulta, influenciando, consequentemente, no funcionamento de diferentes genes. E, por tabela, em sua saúde.

A boa notícia é que transformações epigenéticas são potencialmente reversíveis. Não à toa, vários grupos de pesquisa estão estudando o potencial de intervenções (com dietas e exercício físico, por exemplo) para modificar marcas epigenéticas nas células sexuais dos futuros pais e, com isso, proteger o organismo e evitar doenças crônicas em seus filhos.

Em resumo, a prevenção de problemas crônicos deve começar bem cedo, antes mesmo da concepção. E, nesse cenário, as condições de saúde do pai devem importar tanto quanto às da mãe. Profissionais da área da saúde não podem perder isso de vista.

*Thomas Prates Ong é farmacêutico-bioquímico, professor do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), pesquisador do Food Research Center (FoRC) e membro da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (Sban).

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